terça-feira, 29 de outubro de 2013




Nos rios da memória [não há perdão], mas há rios de querê-la...

Não era chacota! Sentia uma falta inexplicável do seu corpo perto do dela e não tinha a menor pretensão de esconder tal fato. Ficava por horas olhando sua boca fechada e seus olhos pro chão - como se ali ele estivesse a contemplar o Absoluto descrito por Hegel na Fenomenologia do Espírito. Na verdade, amigos, ela era a única determinação do sentido das coisas que formavam o universo dele. Ela! E nada mais nesse mundo. Seus gestos, seus passos, seus olhos e tudo mais que a completava. Ela! Dona de um efeito sobre ele que nenhum outro fenômeno na natureza poderia ser capaz um dia de igualar-se sequer de longe. Era a essência dos verbos, do pensamento, dos atos e fatos que formavam sua estrutura existencial. Como eu disse, ela! E ninguém mais.
E Antonico da Vila Calma, em seu mais alto nível de doçura, orava a cada instante que aqueles sonhos – que apesar de raros, ainda haviam- voltassem, porque neles podia claramente sentir sua pele de moça bonita... e deslizar sua mão com a sutileza de quem observa um autêntico anjo em seu cochilo, sobre sua face e seu busto de deusa radiante; dona dos elementos fundamentais que compõem o significado da palavra amor! Era ela, senhores! Não restava dúvida nenhuma. Com aquele seu cabelo preso e de mãos que, de tão leves, mais pareciam uma folhinha voando pelos parques do céu em pleno outono ventoso que só quem ama pode imaginar tamanha sutileza...
Era esse o amor de Antonico: a mais bela entre todas das mulheres do planeta! E ele, aliás, colocaria logo-logo um filho em seu ventre e não esperava outra coisa em sua vida a não ser isso. Casaria com ela nem que fosse o único pedido que tivesse que fazer ao Deus imaculado que rege esse universo que nos acolhe. Não tinha escrúpulos nenhum e pouco se importava pro que as pessoas achassem daquilo que sentia. Ela era a verdade e o sentido das coisas que compunham o mundo. Atrás de si, as coisas eram desbotadas e difíceis de se enxergar. Um anjo! E, a propósito, o único que sobrara na humanidade! Era mais que uma mulher – era a relação de atributos que formavam o conceito de divindade. Somente ela e nenhuma outra. Não gostava muito de beijar-lhe a boca! Nunca gostara, de fato. Beijava-lhe os lábios, os olhos e finalmente as mãos! Seu coração saltitava perto de seu corpo e a mínima percepção que ela se aproximava causava a Antonico um estremeço capaz de tirar-lhe o fôlego e a circulação do sangue que deveria correr por suas veias.
Era ela, meus amigos! A pura determinação do ser em si e por si que por séculos os filósofos tentaram compreender com clareza! E Antonico fora o único homem que pudera experenciar tal sensação! O único! Sua falta não lhe amargurava por completo, visto que volta e meia ela lhe telefonava, mas a falta mesmo que o afligia era do calor de sua fala e de seus abraços fortes que esmagavam sua respiração e traziam-lhe um completo e honesto sorriso aos lábios - porque pedia a Deus que aquele instante jamais acabasse! Quando ela lhe abraçava (toda vez!) Antonico ria consigo mesmo e dizia: que me importa se o mundo acabar daqui pra frente!? Vivi mais que qualquer homem nesse planeta... e com você, meu amor, nos meus braços, eu tornaria a viver cada parte dessa dor novamente em minha pobre e mísera existência de homem sem sentido! Mas pra quê sentido, se o amor rouba-nos qualquer possibilidade de pensarmos racionalmente? Pra quê sentido? Se a simples visão de sua existência já responde e preenche qualquer dúvida que eu poderia ter sobre o intuito de minha vinda a esse mundo? Agora nos imagino numa madrugada escura, repleta de álcool, onde te canto uma canção escrita prum dueto e prometo cuidar do teu filho e protegê-lo dos perigos do mundo e de tudo mais que vier. Logo à frente, num abraço embriagado, choramos e te digo: Te amo, sabia? Te amo...


Como enfermeiras em filmes de guerra 
e violinos em canções de amor

Um comentário: